Quando nos pomos a escutar um disco que toca géneros consanguíneos tais como a soul, o funk, o R&B, e o hip hop, sem que nenhum prevaleça sobre os demais, é mais justo classificá-lo de pop, até porque os recursos de produção apontam no sentido de uma igual e saudável dispersão. Isto é música para ter groove, para proporcionar escape físico e escape mental, que apesar do tom cavalheiresco em que Mayer Hawthorne nunca facilita, foca igualmente aspectos universais dos equívocos e derrotas dos que se prestam a jogar o jogo do amor. Mayer Hawthorne diz de
Where Does this Door Go que pela primeira vez tinha material de sobra para completar até um segundo disco, o que evitou as anteriores angústias em cima da hora que obrigavam a forçar um pouco mais a inspiração para que os álbuns não ficassem abaixo das dez canções, mínimo que a convenção manda. O novo CD, que se fixa numa duração acima dos 50 minutos, ressente-se da abundância. De acordo com o gosto meu particular, agrupo-o em três blocos de canções que respeitam o alinhamento final. As primeiras quatro são bastante boas e se
Where Does this Door Go fosse todo assim estávamos bem servidos. Mas Mayer supera-se a partir de
Wine Glass Woman, primeira de três colaborações com Pharrell Williams (The Neptunes, N.E.R.D.), logo seguida por
Her Favorite Song, que é a maravilha camaleónica que todos reconhecemos, e o programa segue em alta nota até
Corsican Rosé, com nova prestação de Williams (
Reach Out Richard) e também do rapper Kendrick Lamar (
Crime). Ao passar da décima canção, que noutras circunstâncias encerraria um disco de Hawthorne, o material mais não faz que introduzir variações menos brilhantes para o que se ouviu antes. Assim, em modo bónus não assumido pelo artista, que belisca a qualidade geral, encaminhamo-nos para o final de um registo que denota ainda a influência que o próprio Mayer Hawthorne reconhece e promove da parte da banda bissexta de Donald Fagen e Walter Becker, os Steely Dan. Música sofisticada e com groove que nunca está abaixo do espumante e algumas vezes merece ser comparada a champanhe. Como li nalgum lado, Mayer Hawthorne de DJ fez-se cantor, e de melómano tornou-se músico e produtor. Não admira que ele também diga que este é o seu primeiro disco em que os temas estão totalmente de acordo com a visão original. Melhor do que qualquer outro, ele sabe de onde veio, o que faz, e do que fala.