sexta-feira, 9 de agosto de 2013

# 325

Appolonide, Memórias de um Bordel (Souvenirs de la Maison Close, 2011) presta-se a várias leituras, inclusive as que como no caso da publicação Le Parisien vejam nele "um grande filme feminista". Sou da opinião que Bertrand Bonello quis fazer um filme de fantasmas, algo que evocasse em particular o ambiente vivido num bordel de Paris, na passagem do século XIX para o seguinte, quebrando o aspecto realista da cuidada reconstituição com a música, instrumental ou cantada, clássica ou contemporânea, que existe para reforçar a atmosfera do filme, como se de um sonho se tratasse. O filme começa precisamente com um sonho, contado por uma das prostitutas, Madeleine, ao seu cliente regular. O nome Madeleine não é fruto do acaso, pois não arrisco muito ao dizer também que Marcel Proust é a maior referência do filme de Bonello. Madeleine funciona duplamente, quer como propulsor da evocação que o filme faz, quer como observador da acção, colocado a uma certa distância a partir do momento em que fica desfigurada e deixa de poder trabalhar como dantes. Madeleine é o elemento que liga os diferentes quadros, de um luxo decadentista, quando se trata de cenas em interior, ou de um pós-impressionismo renoiriano, como no episódio do piquenique das raparigas do lupanar parisiense que depois se banham nuas no rio. Bonello decide quebrar bruscamente a unidade temporal quando nos mostra no final as ruas de Paris com as profissionais que se oferecem a quem passa de carro. Despertado do sonho, este filme que nunca se define em relação ao que mostra, a não ser no plano estético, abre-se para o plano do real, fora da casa, fora do sonho, fora da imaginação.  

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